terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Goleiro do Bangu fica bêbado e Fla se dá bem

Fala Galera


História retirada de uma das obras-primas de Mário Filho: 'O Negro no Futebol Brasileiro'.



Heráclito era um marinheiro negro que jogava no gol. Não era da fábrica, não era de Bangu. Para treinar tinha que fazer a viagem de trem, uma hora de trem. Chegava sempre atrasado. Bom quíper, não resta dúvida. Quando não estava bêbado. 
Acabado o treino, Heráclito deixava-se ficar lá por cima, num botequim. Bebia os seus dois dedos de cachaça, tomava gosto, não queria sair mais do botequim, só saía carregado.

Às vezes dava para valente, derrubava mesas, às vezes ficava sentimental, passava os dois braços em volta do pescoço de quem vinha buscá-lo, punha-se a chorar. Então ia embora para casa feito um menino obediente. Se, porém, botasse os olhos numa garrafa de cachaça, perdia a cabeça. Mesmo na hora de entrar em campo.

Foi assim que o Flamengo se cansou de fazer gols contra o Bangu. Heráclito esvaziou uma garrafa de cachaça na horinha de entrar em campo. O pessoal do Bangu só percebeu depois que não havia mais remédio.

E Heráclito tinha assinado a súmula direito. Demorando um pouco, é verdade, mas sempre demorava, caprichando na letra. A cachaça ainda estava fazendo efeito. O que chamou a atenção de Guilherme Pastor foi a maneira de andar de Heráclito. Empertigado, duro, andando devagar, cheio dessa dignidade que só uma grande bebedeira pode dar.

O Heráclito não podia estar bêbado. Como? Amanhecera sem uma gota de álcool no estômago, tinha feito até a prova do hálito. Heráclito chegou no gol, aí começou a balançar feito pêndulo. A última dúvida de Guilherme Pastor foi-se embora. Heráclito estava bêbado, ia engolir todas as bolas.

Guilherme Pastor mandou buscar, a toda pressa, um vidro de amônia. O jogo começou e nada do vidro. A primeira que foi no gol entrou. Heráclito quis defendê-la com um tapa, apertou os olhos, deu um tapa no ar, perdeu o equilíbrio, caiu. Custou a se levantar. Para levantar-se teve que se agarrar à baliza. E ficou abraçado na baliza um bocado de tempo.

Só depois do segundo gol, reprodução do primeiro, é que o vidro de amônia chegou. Guilherme Pastor foi para trás do gol, aproveitando toda bola fora para fazer o goleiro cheirar o vidro de amônia. Heráclito cheirava com força, não podia demorar, tinha que ir para o meio do gol. E as bolas entrando. Heráclito melhorzinho, mas ainda bêbado, ainda vendo dobrado, duas bolas em vez de uma.

Nota do blog: o jogo em questão foi realizado no dia 30 de junho de 1912, em Bangu. O Flamengo venceu por 7 a 4.

A ficha técnica, segundo o Fla Estatística é:

Flamengo 7 x 4 Bangu
Campeonato Carioca - 1º Turno
30/06/1912 - Estadio: Rua Ferrer - Rio de Janeiro
Time:Baena, Píndaro, Nery, Cintra, Gilberto, Galo, Borgerth, Arnaldo, Baiano, Gustavo e Amarante.
Gols: Baiano (3), Arnaldo (2), Borgerth e Amarante.

Fonte: Bola de Meia

Saudações,
Michel Macedo

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